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quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Construindo um nascimento


Imagem: arquivo pessoal

Faz quase um ano que pari naturalmente pela primeira e, muito provavelmente, última vez. Como a concretização do efeito borboleta, eu ainda sinto as ondas de revolução que isso vem causando em mim mesma. Quando eu penso nisso, quase rio de mim, porque, em verdade, eu me sinto diferente, sou diferente, mas ainda sou a mesma.

O que mudou foi a maneira como eu enxergava o mundo a minha volta, minha relação com ele. Eu, Janine, ainda sou a mesma pessoa. Bem, talvez a mesma não, sou a minha versão mais madura, mais experiente até aqui. Sou o melhor de mim até este momento.

Eu soube muito antes de engravidar do Pedro que meu próximo filho nasceria de parto domiciliar. Eu não cogitei outra maneira para ele nascer. Após o teste positivo eu passei mais ou menos cinco meses de gestação arquitetando planos, lendo muito e concatenando ideias para convencer meu marido e as pessoas a minha volta de que parir longe de um hospital seria o melhor, o mais seguro para mim e para o meu ainda desconhecido filho.

Meu marido não foi fácil de convencer. Ele, como todos a minha volta, tinha muito medo de estar fora de um hospital durante um evento tão problemático quanto o nascimento. E se acontecesse alguma coisa? Eu já havia parido num hospital, não estava traumatizada, então por quê isso agora de querer parir em casa?

Eu mesma ainda encontro muitas respostas para esta simples pergunta, ainda que no dia em que ele a fez eu não tenha encontrado nenhuma coerente para dar, a não ser a resposta de alguém que se sente acuado, desencorajado a fazer algo que todo seu ser implora para que seja feito: eu briguei, gritei e por último reivindiquei o parto como meu de direito. O parto era meu e de mais ninguém e eu pariria meu filho como melhor me aprouvesse, com ou sem o apoio dele. Digamos que a partir de então ele tenha ficado sem muitas opções.

Eu acredito que o parto era mesmo só meu? Sim, com todas as letras, sim. Eu acredito que o evento do nascimento de um filho diga respeito apenas à mãe? Não, mil vezes, não. São eventos diferentes e talvez por isso eu tenha escrito relato de parto e nascimento do Pedro, e não apenas relato de parto.

Quando meu marido se mostrou pouco simpático à ideia de um parto domiciliar eu passei a lutar como uma leoa acuada, em defesa da minha ideia, da minha vontade de passar por esta vida com ao menos uma experiência de parto respeitosa para mim e para aquele que viria.

Morando no fim do Brasil, não havia reuniões de grupos de apoio à maternidade para que eu pudesse levá-lo a interagir com outras pessoas. Eu precisaria provar que parir longe do hospital era seguro e viável. Foi um excelente artigo da Dra. Melania Amorim que acabou por convencer o futuro pai do Pedro de que tudo estaria muito bem com um nascimento em casa.

As demais pessoas a minha volta eu desisti de tentar convencer. Se o meu marido, meu companheiro, que me conhece como mais ninguém nesse mundo, havia reagido daquela forma, eu não poderia esperar reações diferentes. Resolvi calar.

Hoje eu percebo que agi como um animal acuado durante todo o processo de construção do meu parto. Eu me sentia lutando contra o mundo, contando com palavras encorajadoras de pessoas que não me conheciam (e ainda não conhecem) pessoalmente. Mas apesar de tudo, em nenhum momento eu duvidei de que conseguiria.

Olhando para trás eu vejo que o início do meu TP naquele dia nove foi apenas a cereja do bolo de um processo que eu já estava vivendo há mais de dois anos. Quando eu percebi que estava em trabalho de parto, eu não quis ninguém comigo.

Ao contrário do que havia lido em vários relatos, onde as mulheres ao perceberem o início do evento esperado corriam a ligar para suas equipes, eu não senti vontade alguma. Eu queria ficar só com meus pensamentos e minhas contrações. E me mantive assim até que meu marido pediu pela milionésima vez que eu chamasse a doula e avisasse que já estava em trabalho de parto.

A doula, muito experiente, percebeu que eu desejava estar quieta e nada fez. Sugeriu uma posição, eu segui. Levou-me ao chuveiro. Contou minhas contrações. Aumentou o volume de uma música quando comentei que gostava muito dela.

E nesse momento eu senti prazer durante meu trabalho de parto. Não prazer sexual, mas eu pude sentir o clímax, o poder de gerar a vida, o poder de se abrir para o renascimento. Ouvindo as batidas daquela música eu sorri a felicidade de logo estar com meu filho nos braços; e chorei o final de um processo que estava sendo tão especial para mim.

3 comentários:

  1. Lindo Nine! Adorei seu relato, sua coragem e fiquei admirada com sua percepção. Uma sensibilização, o sentir o próprio filho e principalmente suas vontades! Muito bom que deu tudo certo. Fico feliz! Sabe que não teria coragem, sei lá... um receio enorme de acontecer algo para meu filho e não ter uma equipe médica ao lado, de não dar tempo... sabe? Respeito completamente as pessoas que desejam um parto humanizado. Também tive dois partos normais, com grande respeito a esse momento, algo incrível e que jamais esquecerei... Beijos! Voltei, viu? rs

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  2. Que lindo!
    Que lindo!

    Fantástico texto, parabéns! Fantástico!!

    Parabéns pela força de seguir, mesmo tendo alguns empecilhos no caminho, por não ter desistido, por ter sido fiel ao que vc sentia. Parabéns!

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  3. Foi o relato mais Humano, mais sincero, mais emocionante e mais Materno que já li.E me emocionei às lágrimas...que maravilha ! Que coragem de escolher aquilo que sente e acredita ser o melhor para si e para seu bebê. Que a Grande Mãe a abençoe e a todos os seus, agora e sempre.
    Ficarei feliz e honrada com sua visitinha.
    Grande e carinhoso bj,

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